domingo, 12 de junho de 2011

Dia das Namoradas Mortas

Quero aproveitar o 12 de junho para pôr em relevo um fato e uma entrevista do deputado, delegado e pastor João Campos. Este, disse ser contra qualquer manifestação de violência e preconceito. Não apenas isso, como também disse que a “prática de homossexualismo” (como prefere usar), “de fato, não é normal”. Segundo ele, isso é segundo Ele, ele e a sociedade – não parte dela, mas “a sociedade”, o que significa que o deputado desconsidera a minha existência e quer calar no falso consenso opiniões como a minha.
Mais que isso, a empreitada que está por vir é cobrar explicações das 260 mortes de homossexuais relatadas pelo Grupo Gay da Bahia. “Estão dizendo que, em todos os casos de assassinato de homossexuais, a motivação foi a homofobia. Será que é verdade? Qual o perfil dos autores desses assassinatos? São os companheiros ou terceiros? Será que tem alguma motivação relacionada com droga, álcool, prostituição? Será homofobia ou o gay está sendo vítima de violência da mesma forma que o heterossexual?”.
         Os “todos os casos” de que fala está no cálculo da estatística, colocado em questão apenas para o lado da balança que lhe pende. Por que não questionar se, no ano passado, houve casos de assassinato por homofobia que a pesquisa não conseguiu perscrutar?


         Fato consumado

         Disse também que gostaria de destacar um fato. Dedicamos o 12 de junho a casais enamorados. O deputado João Campos, a respeito dos 60 mil casais homoafetivos aferidos pelo IBGE em compartilhamento de domicílio, disse que estes 120 mil brasileiros são “inapropriadamente chamados de casais”. A ele, o nome dessa manifestação de amor é dupla ou par.
         Não sou pastor, delegado, nem deputado federal e não sei se, imbuído desses títulos, teria autoridade de julgamento para inferiorizar casais gays em relação a casais héteros. Talvez bastasse o fato de ser gay para medir a intensidade de um relacionamento com outra pessoa do mesmo sexo. Talvez nem precisasse ser gay ou hétero, e só humano, para ter ideia do que signifique uma união de pares.
João Campos reclama a autoridade de falar em nome da vida afetiva e intransferível de todos os seres humanos. Todos eles algemam-se em seu padrão porque disso depende a validade doutrinária do que ele prega. A soberania íntima da pessoa para relacionar-se com quem bem entender põe em embaraço o discurso de Procusto do deputado: aquele que talha a vítima para encurtá-la ao tamanho de sua mesa ou estica-a para o mesmo fim, atendendo à sanha mutiladora de forçar toda diversidade de forma a penetrar o mesmo buraco de agulha.
         Campos não sabe se 260 assassinatos no ano passado foram cometidos por homofobia e acredita que quando dois gays (por ele interpretado como dois não normais) unem-se como casal, não devem ser chamados de casal.
         Eu, Luís Gustavo, gay, não pastor, não delegado, não deputado, não acredito ser possível que um pastor, delegado e deputado – todas funções potentes de prezar e assegurar o bem comum – possa insuflar de tanta intolerância e desrespeito os pensamentos que professa em nome de seus interesses (absolutamente incongruentes a interesses de Deus ou da coletividade).
         A homossexualidade não “contraria toda a ordem natural das coisas”. Ser gay não prejudica a vida humana. Por outro lado, ofendê-la, sim.
         Para mim é inexequível garantir a causa das 260 mortes alegadas por homofobia, em 2010. Mas tenho conhecimento de, neste ano, um crime: a morte de Adriele Camacho, aos 16 anos, por namorar outra garota, de 15, de quem a família, por ser contra, como João Campos é, tramou a morte a facadas. Ela não comemora o 12 de junho com a namorada, consumando o impedimento simbólico (do discurso de João Campos) e literal (por parte dos familiares que assassinaram a adolescente) de serem um casal.
         A violência simbólica de João Campos está ligada a um sangue real. E, um ou 260, casal ou par, normal ou não, o assassinato de um homossexual por intolerância é imperdoável, ainda que defendido em nome de Deus – como se isso fosse suficiente para Ele assinar embaixo.

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