domingo, 1 de maio de 2011

A grande virada

Olá. Maio e eu voltamos*. Em começo de semana, domingo. Um século e um quarto atrás, a revolta de Haymarket amotinou operários de Chicago que protestavam por melhores condições de trabalho – daí, explicam a origem para comemorações internacionais vividas no dia primeiro.
Um século e um quarto depois, números preliminares do recenseamento 2010 são divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A nova cara do Brasil não é predominantemente branca. Pela primeira vez na história dos Censos, 123 anos depois de assinada a Lei Áurea (1888; em 13 de, também, maio), menos de 50% dos brasileiros se declararam brancos.
O nó racial oferecido na pesquisa do ano 2000 foi designar “preto” para identificar parte da população negra, também formada de pardos na metodologia do instituto. A década corrida foi arena em que digladiaram debatedores da política de cotas. Contrários a ela não se declaravam iminentemente racistas – antes, defensores da tese de que, estabelecendo as cotas, se reforçava a ideia de incapacidade dos negros; que a questão maior era a pobreza e, logo, os grilhões eram econômicos, não os raciais; que um cotista derrubava a vaga do branco esforçado, porém excluído pela vaga a menos; e ouvi de uspianos que a realidade do cotista em sala de aula (na dita melhor universidade do País) era de negros isolados por seus professores e, em segundo momento, evadidos. Só faltou argumentarem que a causa da desistência era, no caso “singular” da negritude, banzo.


Mostra a tua cara

Foi importante que a primeira década do milênio tocasse o dedo em feridas seculares. Nenhum argumento para justificar a queda das cotas nas universidades, por mais canhestro, como o não de alguns professores quanto a educar os cotistas, ficou preterido do debate.
Hillary Clinton acrescentou à discussão ao vir ao Brasil e dividir a experiência dos EUA nas ações afirmativas, que garantiram, dentre outras conquistas, a ocupação da presidência do país por um negro. A secretária de Estado confrontou as estatísticas nacionais, que pesam um lado da balança com metade de sua população afro-brasileira e esvaziam o outro, com apenas 2% dela ocupando assento no ensino superior.
Não se justificou defender o ensino público de qualidade em oposição às “paliativas, infundadas e preconceituosas” cotas, pois a solução ideal de quem prefere o negro ao sabor unicamente de seu talento e sorte, em pés de desigualdade estatística e histórica com os brancos no Brasil, não é exequível.
Por quê?
Porque não vingou a propositura do senador Cristovam Buarque (PDT) sobre filhos de políticos frequentarem escolas públicas (leia-se, a maioria dos políticos assume o indigno trabalho prestado contra a Educação no País e nega-se a degustar do cardápio indigesto oferecido aos brasileiros – com a irônica ressalva dos registros de desvio de dinheiro público destinado à merenda escolar de “brasileirinhos”, como outrora referiu-se a president Dilma ao falar dos nossos alunos). Porque o Brasil não exigiu essa nada mais que justa aplicação (ou seja, entende-se que esteja tudo certo no fato de caber somente aos pobres o dissabor da deseducação). Porque a má educação forma maus professores (e, em contexto assim, é normal ouvir testemunhos de que até na catedrática USP há professores negligenciando os que mais precisam de sua atenção).
É dever do Estado chamar para si a responsabilidade sobre as limitações do País. Cumpre com seu dever o cidadão que exige representatividade de seus eleitos. E o Brasil faz muito bem em, cada vez mais, enxergar a própria cara.


*Após meio-tempo suspenso, o blog ‘Será que L. é?’ recomeçou em 01.05.2011.

Nenhum comentário:

Postar um comentário